A dor do outro

Ontem ouvi uma história. E aprendi uma lição. Alguém que diariamente se expõe como figura pública, falando diariamente no rádio para uma multidão, passou a ser criticado às enxurradas com impiedosa aspereza. Sua voz não era bonita para o rádio, sua dicção não condizia com o padrão. Pouco importava que fosse inteligente, dono de um humor sarcástico e perspicaz e que agregasse valor ao que (bem) fazia. Não merecia estar no lugar que ocupava e certamente seria bafejado com algum privilégio, diziam. Sairia da cama e entraria no ar para falar meio dormindo, desleixado? Beberia antes de trabalhar? Usaria drogas? Eram certeiros e definitivos em suas opiniões: não servia para o que fazia. Estragava a estética padronizada do programa. Desagradava ao senso crítico.

Nosso personagem, produtor de um programa de rádio de sucesso, lia, ouvia e absorvia calado cada um dos comentários. Seus colegas, que conheciam sua condição, esbravejavam e ansiavam por enfrentar e responder aos humanos desumanos. Ele preferia dar de ombros. 

Até que três anos depois, resolveu dividir com a audiência sua luta. Contar que enfrenta diariamente uma grave doença neuromuscular degenerativa que enrijece cada músculo de seu corpo, inclusive aqueles que interferem na fala. Caminha com dificuldade, ainda que jovem e forte, e para falar, enfrenta uma batalha. Se submete aos mais modernos tratamentos e mesmo com uma evolução incerta, não esmorece. Acredita que vai vencer. E nunca, absolutamente nunca, se posiciona como vítima. Trabalha a custo e sacrifício, lutando e se superando diariamente. E mais do que informar, ensinou. 

Primeiro, que qualquer luta, qualquer dificuldade, qualquer desafio que a vida imponha, fica menor se enfrentado com coragem, com leveza e, se ainda der, com algum humor. 
E,  principalmente: nesta vida tão cruel e que tanto desafia, costuma ser fácil julgar os outros, ter opiniões e certezas definitivas sobre a vida alheia. Difícil é conhecer e se colocar no lugar do outro. Conhecer suas batalhas, saber de suas dores e, ao invés de julgar como juiz supremo, reconhecer, aprender e aplaudir sua caminhada.

Autor: Luciano Almeida



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